17 de março de 2008

Freio de camburão


Para viver nas grandes cidades é preciso seguir padrões. Padrões que foram pré-definidos por uma sociedade estúpida. Tão estúpida que ilustres representantes da sociedade campista viraram atração principal do Jornal Nacional.
Nada pior que pessoas que usam e abusam de padrões para esconder o preconceito. E os que mais sofrem são os excluídos, aqueles que não se adequam a nenhuma regra ou a nenhum tosco padrão da sociedade. Nessa lista estão negros, punks, roqueiros, revolucionários, ciganos, motociclistas, darks, rastafaris, tatuados, os que usam piercing, enfim, todos os que são diferentes. Em Campos, basta ser diferente para ser alvo de piadas, cochichos, de velhinhas assombradas dizendo: “Nossa que menino esquisito!” ou então “Meu Deus que cabelo feio!”. Não devia ser assim. Mas é. Pois o problema não é o que é diferente, mas sim o que a sociedade não aceita como o certo, como adequeado para seus moldes.
Nada pior do que colocar um boné e ser chamado de malandro, ou colocar um chapéu e ser chamado de vagabundo. Se for tatuado então... além de vagabundo é maconheiro! Se gostar de rock... pior ainda, maconheiro, vagabundo e drogado! Se for magrelo demais além de tudo isso deve ter Aids. “Olha só como aquele cara ta magro! Deve tá com Aids”, reflita, você já disse ou pensou nisso pelo menos uma vez.
Em Campos (e volto a afirmar que isso não é um privilégio de nossa querida planície goytacá) basta um chapéu para frear um camburão. Freio de camburão é negro andando de bicicleta, homem de chapéu, garotada voltando do baile, trabalhador voltando da lida de boné, favelado voltando pra casa...
A polícia é o braço da sociedade, força ostensiva, armada para servir e proteger, mas como ela é o tal “braço”, carrega os mesmos preconceitos que todo mundo. Os policiais são treinados para detectar criminosos, elementos suspeitos, pessoas que podem, de alguma forma, oferecer perigo para a sociedade. E o que faz de alguém um elemento suspeito? Um boné? Um chapéu? Andar sem camisa a noite? Cabelo rastaffari? Andar de bicicleta com alguém na carona? Tudo é subjetivo.
O que ninguém imagina é que o crime está onde menos se espera. Quem poderia imaginar que pessoas distintas, gente de tão alta estirpe, seriam suspeitas de roubar dinheiro público? E olha que nenhum deles usa boné, chapéu, anda sem camisa à noite ou tem cabelo rastaffari. Nunca conseguiram frear um camburão. Mas fizeram um avião da Polícia Federal estacionar.
Quantos trabalhadores já não foram humilhados ao serem confundidos com marginais? Com ladrões? Quantas vezes garotos não tiveram que colocar a mão no paredão para levar uma “geral”? Confundir trabalhador, pobre e negro com ladrão é fácil. São todos elementos suspeitos. Mas a regra não se aplica a todos, ou pelo menos não se aplicava. Os elementos suspeitos estão onde menos se espera não é mesmo?
Em um lugar onde andar de chapéu a noite pode ser perigoso, é melhor parar e reavaliar nossos conceitos. Repensar nossas atitudes e tentar descobrir onde escondemos nosso preconceito. Devemos decidir se vamos seguir os padrões da sociedade ou se vamos seguir o que nos deixa feliz e que nos realiza. É preciso ter coragem para não seguir regras pré-estabelecidas e dizer não para o que a “nata” da sociedade diz que é certo. Não se trata de fazer o que é errado, de agir de forma ilícita, anárquica, ou de burlar leis, mas sim, de poder agir com liberdade sem libertinagem e poder andar nas ruas sem medo de frear um camburão.

1 comentários :

VELOSO disse...

Parabéns pelo profundo , verdadeiro e atual texto é uma realidade que infelizmente ajudamos a perpetuar! Para ler pensar e repensar nossas atitudes!