3 de março de 2008

A Era da Incerteza

Tomei emprestado o título do segundo album do grupo de rock Biquini Cavadão, de 1987, para ilustrar o atual momento da música em Campos. Prestes a passar por um dos mais humilhantes e vexatórios episódios de sua história, a música campista, e os músicos da planície goytacá, se dividem entre os que têm medo e os que não têm. Os músicos que não têm medo se recusam a pisar em um palco para serem julgados por quem quer que seja. Principalmente quando o que está em julgamento não é a sua obra, mas o seu talento, a sua vocação e sua profissão. E justamente por que não têm medo, mostram que como todo bom músico não precisa provar nada a ninguém, a sua música fala por ele, e afinal, já está consagrado pelo público há muito tempo.
Do outro lado há os músicos que têm medo. Medo de perder dinheiro, de nunca mais ter onde tocar, medo de perder o espaço para outro e medo de perder o maior cachê da cidade. Afinal ninguém paga tão bem em Campos como a própria Prefeitura de Campos, o que cria uma indústria de músicos, de shows e de bandas. O medo desses músicos não é perder o seu espaço, por que nenhum deles está preocupado com espaço. A briga não é mais para conseguir um lugar no coração do público, mas sim para demarcar territórios.
A nova era da música em Campos decretou o fim do romantismo, das bandas de garagem e da formação de músicos que queriam mostrar seu trabalho e mudar alguma coisa com a música. Foi-se no tempo em que os músicos nasciam por amor à música. Hoje, o grande barato é formar uma “bandinha” para tocar na Prefeitura, afinal quem mais vai pagar quase três mil reais para ouvir covers de Legião Urbana e Jota Questem uma tarde cinza de verão, na praia, com um público quase zero? Só mesmo a Prefeitura pode fazer um “favorzão” desses para os músicos.
Os músicos medrosos, que têm medo de sair do seu quintal, de expandir seus horizontes e conta com o cachê da Prefeitura para sobreviver, foram os primeiros a se inscrever. Os medrosos, que não querem mostrar seu trabalho além das fronteiras de Ururaí, precisam mesmo se inscrever, pois se não tocarem nas apresentações encomendadas pela Prefeitura onde irão tocar? “As inscrições estão bombando”, comemora a Gerência de Cultura de Campos. É claro! Sob a ameaça de que não vão mais tocar, até mesmo quem não tem banda monta uma para poder ser empregado da Prefeitura.
Os músicos que não se apresentarão no show de calouros armado pela Prefeitura de Campos estão decretando sua sentença de morte? E os músicos aclamados e consagrados pela crítica e pelo público? Nunca mais tocarão em eventos da prefeitura certo? Nunca mais recebem cachê do governo municipal, mas não estão impedidos de mostrar a sua arte onde quer que seja, de graça, ou pagos por quem quer que seja.
Há muito tempo, quando a Prefeitura se preocupava com outras coisas além de pagear os músicos com os quais simpatiza, os artistas faziam seus shows, tocavam nas praças, cantavam nos bares, organizavam festivais e eram todos felizes. Nessa época metade dos músicos inscritos para o teste, sequer eram nascidos.
O que diriam então os campistas Delcio Carvalho, Eli Miranda, Roberto Ribeiro e tantos outros se fossem intimados a comparecer a um teste de qualidade onde o presidente do corpo de jurados não sabe a diferença entre um Dó ou um Ré? Hoje músicos tão bons quanto os citados acima, estão entre os muitos que vão se sujeitar ao teste de qualidade da gerência de cultura de Campos. Embora seja revoltante e humilhante, não cabe aqui nenhum julgamento a esses músicos. Eles precisam dos shows. É melhor que façam, afinal se não tocarem para a Prefeitura não tocam para ninguém. E se tocarem, (e acredito que toquem por que embora sejam medrosos, são talentosos) não vão ganhar o mesmo que ganham tocando pelo governo municipal. Melhor fazer e torcer para ganhar uma nota maior que D.

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