O poeta Cazuza afirmou pouco antes de morrer que “a burguesia fede, a burguesia quer ficar rica, enquanto houver burguesia, não vai haver poesia”. Ele não estava errado, lógico. Mas também não tinha autoridade para ser o arauto dos plebeus, afinal era um pequeno burguês, mimado e desajustado socialmente, que embora fosse um cantor razoável e um poeta fantástico, se envolveu com drogas, tinha uma vida sexual lasciva e morreu de Aids em 1990. Mas em sua infinita “sabedoria poética” estava certo ao alfinetar a burguesia.
Aqui na planície goytacá, os burgueses são tão ruins quanto em qualquer lugar. E para piorar acham que são arautos da plebe, defensores dos fracos e dos oprimidos. Mentirosos como todos os burgueses, comem, bebem e se fartam em festas onde não comemoram nada, pelo simples prazer de se encontrar e ostentar poder e riqueza. Pelo prazer de mostrar para a plebe que o dinheiro pode tudo. Até mascarar os seus atos. Os burgueses de Campos, novos ricos, arrotam feijão para mostrar para a sociedade que estão próximos da plebe, que estão próximos do povo, mas não estão e nunca estiveram. A maioria deles nasceu em berço de ouro e até os que não nasceram em berço de ouro, que trabalharam muito para chegar ao topo da sociedade, esquecem e renegam o passado de rudes plebeus e comem caviar, arrotam feijão para mostrar a sociedade que são pessoas legais.
Dar dinheiro para o menino no sinal de trânsito, colaborar com a caixinha na padaria, tudo isso não resolve. Colaborar para um país melhor, no nosso caso, uma cidade melhor, é o que deveria ser feito, mas é só abrir os jornais para ver onde os burgueses de Campos gastam o seu tempo e seu “suado” dinheiro.
E para piorar querem passar uma imagem que não têm. Fingir que se preocupam com a “conjuntura política”, com o “mal que assola a cidade”, com a “economia em frangalhos” ou com o índice Down Jones... besteira. Não se preocupam com nada disso, somente com o fato de que sem dinheiro não poderão manter o estilo de vida, estilo que é uma afronta aos que não tem nada! Aos que não podem comer feijão todos os dias por semana, por que o quilo do feijão está custando quase cinco reais. Em contrapartida, é “chique”, “estiloso”, “tradicional” encher um salão de burgueses para degustar uma comida inventada por escravos dentro das senzalas.
Enquanto a distribuição de renda for desigual, enquanto muitos tiverem pouco e poucos tiverem muito, vamos ter que agüentar os ricos e seus chiliques. Os novos ricos e seus novos chiliques, pois quem nunca comeu melado, quando come se lambuza, e se lambuza tanto que acaba indo preso por comer demais. A solução não está nas instituições filantrópicas e muito menos no comunismo. A solução está no trabalho. E não adianta dizer que os “grandes” empresários de Campos dão trabalho. A solução está no trabalho e não na exploração do trabalho alheio. Pagar de forma justa é um bom indício de que uma melhor distribuição de renda pode começar.
O primeiro passo pode ser dado pelos plebeus, que em nada diferem dos burgueses são todos de carne e osso. Acreditar que não se é pior do que os nossos amigos “ricos” que aparecem nos jornais arrotando feijão e com um sorriso amarelo, divagando sobre a situação política de Campos é um bom começo. Esperando como abutres o próximo governante ou como fazer, “com a ajuda de Deus”, para multiplicar a sua fortuna. Como cantava uma banda de Brasília, “a plebe está cansada de ajoelhar esperando a ajuda de Deus”. Em Campos, a plebe está de joelhos há muito tempo, debaixo das botas dos coronéis, dos usineiros, dos empresários do petróleo, dos empresários do comércio e de tantos outros que acreditam que estão fazendo um bem enorme para o universo comemorando “nada com coisa nenhuma”.
Aliás, comemorar é o que mais sabe fazer a burguesia, tudo é motivo de encontro, tudo é motivo de festa, tudo é motivo de comemoração. Transformam em tradição momentos que não significam nada, que não prestam para nada, só para ostentar riqueza e poder, só para mostrar para o pobre plebeu, o quanto ele está longe de ser abastado. Nosso “ricos” falam de um milhão como se falassem de dois reais. Negociam o trabalho alheio como se estivessem eles mesmos trabalhando de sol a sol. Bater uma laje ninguém quer não é? Enfrentar um tanquezinho de roupa também não dá não é? Andar sob sol forte para trazer o pão para dentro de casa... nem pensar. A burguesia não sabe o que é isso e não se importa quando rouba dos pobres para dar aos ricos, e para ficarem cada vez mais ricos.
Então só resta aos rudes plebeus, brindar, e comemorar, “celebrar a estupidez humana”, “nossa cidade e sua corja de assassinos, covardes e ladrões”. “Vamos celebrar nosso governo e nosso estado que não é nação”. Há muito o que celebrar não é? Certamente, nós os plebeus, temos muito o que celebrar, o que comemorar. Então, um brinde, com arroz, ki-suco e feijão.
Arrotando feijão
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